sexta-feira, 3 de dezembro de 2010

ESCOLA GUIGNARD, ALUNOS PROFESSORES

Éramos 40 alunas, jovens cheias de vida, direcionadas por um mestre que viera do Rio para nos conduzir. Viera cheio de idéias novas, trazendo panoramas abertos para o aprendizado de arte em Minas. Deixara o Rio de Janeiro onde já era considerado o maior professor de arte do Brasil e também um dos maiores artistas brasileiros.
Viera da Europa, lecionar no Rio, na Fundação Osório, onde foi mestre de grandes artistas, tais como Iberê Camargo, Ana Bela Geiger e outros, já conhecidos e famosos. Era amigo de Cândido Portinari, Roberto Burle- Marx e também considerado por escritores e poetas. Cecília Meireles lhe dedicava versos, o grupo de intelectuais de São Paulo veio a Belo Horizonte para a inauguração da Semana de Arte Moderna em Minas. Escutei discursos inaugurativos, palestras dos escritores vindos de fora , com Guignard à frente deles, mostrando como o academismo amarrava os artistas.
Guignard era um revolucionário contra o academismo vigente na época.
Seu método de ensino baseado no despertar pessoal de cada aluno, assemelhava-se aos ensinamentos de Johannes Itten na Bauhaus de Weimar.
“Formar primeiro o homem, para depois formar o artista”
Despertar em primeiro lugar a sensibilidade, o olhar atento para a natureza, as árvores, os céus, as nuvens, os desenhos que se formam nas paredes velhas, nas pedras, no corte das árvores, nas sombras do chão. Ver os círculos que se formam nas águas quando ali atiramos uma pedra.
Observar o olho humano, mandala cheia de vida e de mistérios.
Estar atento ao “agora”, à natureza do parque municipal de BH, com suas árvores seculares. As pessoas morrem e as árvores ficam dando sombra protegendo do calor o transeunte que ali passa.
As árvores do parque vão revelando as histórias do passado.
Antigamente o zoológico era ali também,dentro do parque, e as crianças brincavam com os macacos que estavam por detrás das grades.
O parque era sempre cheio de motivações para o nosso imaginário de jovens artistas. Passávamos horas sem perceber o tempo debaixo daquelas árvores, sentadas em banquinhos, desenhando com lápis duro, 6H.
O desenho nos dava a possibilidade de praticar o exercício da concentração, uma meditação espontânea, sem intenção de ser meditação.
Paralelamente ao desenho de observação, dado debaixo das árvores, Guignard nos orientava também, dentro do atelier. Fazíamos retratos e figuras do natural, como nas academias de belas artes.

Na década de 60 eu era professora da Escola de Belas Artes Guignard e ali ocupava a cadeira de desenho de criação. A escola estava situada no parque municipal de BH nos porões do Palácio das Artes. Ali Guignard lecionou, mais tarde seus alunos o substituíram. A escola era pobre, sem recursos, mas rica em talentos. Vários artistas saíram dali e seguiram mais tarde seu próprio caminho. Pierre Santos era diretor e eu vice diretora.
A posição de vice é cômoda, sem grandes responsabilidades. Mas, um belo dia ele me passou a direção sem aviso prévio.
Levei o maior susto, fiquei sem dormir uma noite.
A escola estava afundando por falta de recursos.
“Já fiz o que pude, a escola não vai acabar nas minhas mãos, você que foi aluna de Guignard, dê um jeito...”
Procurei vários ex-alunos e todos se prontificaram a dar aulas de graça até que a crise passasse.
Tomamos a decisão de procurar apoio no governo de Minas. Acenamos para os poderes públicos em busca de ajuda e convidamos o Dr José Guimarães Alves para dirigir a escola e ligá-la à Imprensa Oficial. Lembro-me das reuniões improvisadas debaixo das árvores. Foi uma época tumultuada, cheia de imprevistos, mas também coroada de êxito. A solidariedade e o idealismo prevaleceram sobre a iminente derrota. Era necessário oficializar a escola. Afim de legalizar o pagamento dos professores o novo diretor organizou um concurso público de Notório Saber . Todos fomos concursados e, de acordo com a lei, ligados à Imprensa Oficial.

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