quarta-feira, 27 de novembro de 2013

HOMENAGEM À SARA ÁVILA

Para registrar o trabalho de Sara Àvila na Escola Guignard convidei o artista Eymard Brandão, seu ex-aluno, para escrever um depoimento. Segue abaixo o depoimento de Eymard:
“Querida Maria Helena,
Tenho convivido com inúmeros fatos e sentimentos relacionados ao recente falecimento de nossa amiga Sara Ávila.
Domingo passado, quando conversávamos em sua casa, me lembrei de uma aula da disciplina intitulada “Desenho de Criação”, que tivemos com Sara nos anos setenta. Sempre tenho presente que esta foi uma das disciplinas que Sara assertivamente implantou na Escola Guignard, durante o período que lecionou de forma sempre marcante.
Numa dessas aulas de criatividade executei o tema proposto, ou seja, um desenho de paisagem  com caneta esferográfica preta sobre papel, explorando todas as possibilidades que este material poderia oferecer.
Fui para o Parque Municipal e fiz o trabalho. Na minha opinião ficou da melhor qualidade, pois o desenho era ministrado como matéria essencial para domínio de nossos meios de expressão, como você bem sabe e lembra com certeza.
Quando apresentei o desenho realizado ela olhou, olhou novamente e disse:
Ótimo. Mas estas canetas foram concebidas industrialmente para fazer a linha e  podemos ir muito além desta convenção. Então, pegou minha caneta,    quebrou-a pelo meio e rompeu aquele tubo de plástico que contem a tinta, dobrando-o alternadamente algumas vezes. Com esta tinta  e usando diretamente seus dedos, fez uma  demonstração de   belas manchas e  linhas. Foi uma experiência simultaneamente simples, marcante e sempre atual em seu intrínseco significado.
Sara sempre teve um dom, um potencial específico para interagir com os alunos, sem receitas prontas e lidando diretamente com o potencial de cada um  no fazer artístico. Seus ensinamentos, ao exercer o magistério, iam além das salas de aula, sempre integrados a valores éticos e estéticos. Na universalidade da linha, por exemplo,  cada um era estimulado a encontrar sua identificação e seu caminho pessoal. O gesto e o movimento abriam uma porta, as texturas e respectivas tramas outras, e assim por diante com as diversificadas técnicas. Tudo se integrava na criatividade, estimulada além de palavras escritas ou faladas, pois trabalhávamos  essencialmente  com a percepção.
Sara construiu uma sólida trajetória como artista plástica, unindo expressiva cultura ao conhecimento do ofício. E manteve sempre presente importantes elos com nossa contemporaneidade, sem imposturas intelectuais e ultrapassando fronteiras”.
 Ao ler o depoimento de Eymard Brandão sentimos o quanto Sara descondicionava os alunos do convencional, do maneirismo e da repetição. Quebrar os condicionamentos, despertar o novo é uma das formas de crescimento proposta pelo grande mestre indiano Krishnamurti. Sara, sugerindo ao aluno quebrar a caneta, estava lhe propondo usar como instrumento, não o convencional, mas o novo, criado na hora. Suas aulas promoveram mudanças na capacidade criativa de seus alunos.
Despertar o novo na arte e na vida, não percorrer repetidamente os caminhos já trilhados é uma das possibilidades mais instigantes da arte contemporânea.
Sara foi uma das artistas mineiras que mais se projetou no exterior. Convidada para participar do Grupo Internacional “Phases”, sediado em Paris, ela percorreu o mundo com seus desenhos fantásticos. Não rejeitou a arte como forma de expressão, mas seguiu com a arte até o fim, sempre criando. Produziu obras fantásticas que mergulham no inconsciente de cada um de nós e obras líricas, poéticas, da série “Noturnos”. Em sua missa de sétimo dia, realizada no Auditório da Escola Guignard, o “Noturno” de Sara envolvia todo o ambiente com suas luzes. A trajetória de Sara Àvila foi sempre um caminho em direção à essa luz.

*Fotos de Adriana Moura

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Um comentário:

  1. Maria Helena:
    Gostei muito de sua homenagem à nossa amiga Sara Àvila e a intenção que engloba, independente de ter um depoimento de minha autoria.
    Brevemente nos comunicaremos novamente.
    Abs,
    Eymard

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